Tudo bem quando termina bem...

Eu tinha uma notícia na mão, era a melhor notícia que eu podia esperar. Era melhor do que ganhar uma viagem de volta ao mundo, melhor que ficar muito rica da noite pro dia. E melhor, milhões de vezes melhor. E eu tinha, por outro lado, a sensação de não saber exatamente o que esperar quando o dia chegasse. Eu não tinha muito tempo pra pensar porque havia o espaço de um dia entre a notícia e a concretização do fato. Imagina, era tudo que eu queria, era exatamente o que eu esperei durante um ano e alguns meses, era absolutamente perfeito e eu pensei com todas as forças que eu ia fazer de tudo para mostrar que eu era a pessoa certa pra uma vida inteira.

As minhas mãos suavam tanto que eu precisava secá-las a cada três minutos na camiseta. Eu precisava ficar o tempo todo com alguma coisa na mão, pra quebrar, manusear ou simplesmente segurar alguma coisa.
E então, eu o vi. Acho que era exatamente como eu lembrava, mas faltava alguma coisa... Não sei o que, sabe? Só faltava... Ai de repente havia um milhão de coisas que eu podia falar, um milhão de coisas que eu podia fazer, mas eu não queria fazer ou falar nada. Eu não tinha nada na cabeça, todo o medo que eu tive no dia anterior simplesmente sumiu. Eu não sentia nada. Eu não queria abraçá-lo, não queria que ele chegasse perto de mim e não era porque eu tinha medo de me machucar. Era porque eu não precisava mais dele e isso estava tão claro na minha mente que chegava a doer um pouco. Então, tanto sofrimento, tanta espera, tanta dedicação e tanto tapa na cara simplesmente morreram assim? Não era possível, não era. Eu o olhei novamente, a gente caminhou lado a lado, um falando com o outro, contando histórias banais e sem sentido nenhum, sem mencionar qualquer mínimo erro que deixamos pra trás.
O que mais me deixava confusa, no entanto, era que isso não me machucava mais daquele jeito. Na verdade, até me incomodava. Eu estava desconfortável e ele também. Quase como se não pertencessemos nem ao mesmo mundo, ele era um estranho pra mim e eu era uma estranha pra ele. As coisas que a gente falava não tinham nexo nenhum, uma conversa casual, com um desconhecido.
Eu o olhei por mais tempo, ouvindo sem escutar. Absorta no jeito que ele falava, no jeito que andava, articulava. Nada disso me chamava atenção. Era, pra não dizer outra palavra, incrível. De repente eu me toquei e percebi que eu realmente tinha exagerado um pouco, talvez tido uma paixão platônica, uma desejo incontrolável porque era mais fácil imaginar as coisas do que vivê-las e talvez, no fundo, eu realmente não quisesse que isso se perdesse. Eu tinha medo que, quando estivesse ao lado dele, não pudesse suportar a sua rejeição de novo e, no entanto, não havia rejeição mesmo, ali. Havia uma concordância mútua em deixar para trás toda e qualquer possibilidade de ter experimentado alguma coisa. Não havia aquela busca por palavras que pudessem ter um outro significado. Não havia nada, mais nada. Era um amor, em grande parte pelo meu lado, e um amor que não conseguiu sobreviver ao tempo, à rejeição, à distância. Não conseguiu sobreviver nem mesmo na forma de uma mínima cicatriz. Era um traço fino, sem relevo, sem cor. Eu percebi que podia tocá-lo quantas vezes quisesse e meu coração nem sequer iria acelerar. Nada. Eu não perdi meu ar, minha cabeça não rodou, eu não quis chorar. Isso fazia tão pouco sentido que até quisemos encurtar o encontro, pra não ter mais aquela inconsistência no ar, aquela falta de intimidade. Nós não éramos íntimos, não havia nada que me ligasse a ele, não havia nada que o fizesse ficar. E eu não queria, que ele ficasse. Eu queria poder dizer, ao contrário, que sentia muito por ter pensado durante tanto tempo que havia alguma coisa que eu pudesse fazer para nós. Não havia. Não haveria. Nem mesmo quando ele mencionou que estava num relacionamento se acertando, nem mesmo nesse momento eu perdi a mínima noção do meu chão. É tão brega, mas foi quase a sensação de depois de muito tempo presa, você conseguir voar e, pela falta de prática, querer voar para todos os lados ao mesmo tempo. E eu queria que ele fosse embora, queria poder ir para todos os lados ao mesmo tempo e sorrir, rir e pular e chorar e mostrar que eu não precisava mais dele, nunca mais, obrigada.

É claro que, quando eu fui pesar toda essa informação, toda essa novidade, eu senti um pontada de tristeza. Não por ter perdido muito tempo me dedicando a um amor não correspondido, mas por ter perdido, em algumas pouquiíssimas horas, todo esse amor. Eu cheguei até a me questionar, duvidando do que eu tinha sentido, dizendo a mim mesma que um amor verdadeiro, que durou tanto tempo, não poderia morrer dessa maneira. Não quando ele me marcou tanto. Mas eu descobri que era besteira pensar assim, ele foi e vai ser pra sempre o amor mais marcante da minha vida. E foi e vai ser pra sempre o que mais me causou sofrimento. Mas, unido ao fato de ter uma inclinação muito forte para o sofrimento, eu pude perceber que o tempo e a distância, principalmente o tempo, apagou absurdamente bem esse amor de mim. E eu não podia fazer nada, por isso. Não teria motivos reacender uma coisa ruim, não precisava. A cicatriz, por mais perfeita e invisível que estivesse, ainda estava aqui e vai estar pra sempre. As lembranças também. A diferença foi que eu finalmente percebi que não havia motivos pra me preocupar. Eu estava endurecida nesse sentido e, pra mim, assim como eu sei que eu sou pra ele, ele não passa de um estranho, desconhecido.

...E às vezes simplesmente acaba.

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