(dos afagos desesperados)

Olha, a gente se procurou, se procura, foi tudo meio assim, meio do nada. Mentira, não foi do nada, não foi assim que eu vi... mas vai saber, nunca da pra saber o que as pessoas estão pensando, se nem mesmo eu sei, as vezes, o que eu to querendo dizer... Mas a gente se manteve assim meio próximo, onde o limite da sua impessoalidade permitia. Não sei se essa é a palavra certa, pensei em frieza, mas não combina. Acho que pode ser medo, pode ser asco, pode ser indiferença... Não vou ficar aqui tentando adivinhar.
A verdade é que você, assim como eu, tinha um propósito. A verdade é que eu, diferente do que seria o ideal a se fazer, precisei de você desesperadamente. Precisei porque, olha, a culpa foi minha, é verdade, mas precisei primeiramente, talvez, como um amigo. Não estávamos destinados a nenhum mal maior, era só a saciedade de se estar junto – junto a alguma coisa. Não precisava de flores, eu nunca gostei muito de flores. Não queria um chocolate de sobremesa pro almoço, não queria todo dia, toda hora. A gente cria essas coisas em cima das coisas das outras pessoas, é uma mania nossa. A gente fica imaginando o que o outro está imaginando, fica querendo adivinhar, fica querendo se prevenir... Que merda, eu mal sei cuidar de mim mesma, como vou conseguir tomar cuidado com suas ações por você? E você, não me leve a mal, mas não sabe, também, como faz pra cuidar de si mesmo... Pode deixar, eu eu me seguro, você se vira... Eu não minto, eu estava desesperada. Eu estou. Mas estou desesperada em mim, por mim, para mim. Eu acho que você também esteve, mas é só um palpite. Existem pequenos atos que traem palavras, que traem cascas construídas. Existe percepção. Não sou muito boa nisso, mas fui o suficiente pra saber que você se encontrou, em determinado momento, do mesmo jeito que eu... Claro que não foram os mesmos motivos, mas a gente esteve lá – e a sensação é terrível. E nessas horas nada melhor do que passar por ela acompanhado. Eu te entendo. Eu me entendo, ou melhor, eu procuro me entender o melhor que eu posso e, sabe, é uma confusão danada! Eu fico aqui matutando o que seria melhor fazer, qual seria a atitude ideal e, na hora, passo longe. Não é por nada, mas acho que você deve fazer igual, mas é meio que invertido.
A verdade é que esses momentos são de suspensão – da salvação, da perdição – são momentos em que não importa mais nada, porque não precisa importar. São momentos de ausência de reflexão, de pensamento, são momentos de nos dar a nós mesmos o que sentimos ser tão negado. E, depois, não precisamos fazer nada sobre isso, não temos que resolver nada... É sempre tão... simples, tão fácil. E, no entanto, não é possível que o sejam.
Eu decido assim: Não volta. Não, volta. Volta, vem logo e não demora pra ir embora, porque quando for eu vou poder pensar de novo sobre isso e desejar que você não volte. Ou, volte. Não esquece de tentar deixar o coração mais aberto. Não é que eu queira entrar, mas dizem que o medo que está por detrás de todos os outros medos é o do desconhecido e eu morro de medo do seu coração.