2013: O ano que trouxe, levou.
Todo mundo tem aquele ano em que começa meio sem
esperança: o ano seguinte foi ruim e as expectativas foram reajustadas. Esse
vai ser só mais um ano, como todos os outros anos: nenhuma expectativa em
relação ao amor, à faculdade, ao emprego, ao mundo. Mas a gente se surpreende,
mesmo que sem expectativas, com as pequenas peripécias da vida.
Ah, a vida. Que sopro, que espetáculo maravilhoso e
dialético. 2013 me trouxe a necessidade de lidar com o vazio que é quando uma
vida próxima a nós se vai. Eu, que nunca tive que lidar com a dor da perda, do
pedacinho arrancado. 2013 me trouxe – ou me deixou – o vazio de perder um
amigo, uma pessoa querida. Me deu o gosto amargo da inexistência, do fim de um
longo ciclo, da transformação de um indivíduo e todo o seu conhecimento, bagagem,
sentimentos, ações em nada, literalmente. Foi quando eu aprendi que podemos
tentar ao máximo aprender uma fórmula, jamais conseguiremos. Cada um que vai,
ao nosso redor, deixa a falta. De certa forma nos mostra que aos que aqui
ficam continuando a tocar suas vidas, sobra a necessidade de se ajustar e se
adaptar a esse vazio, conviver com ele, entendê-lo ou, no mínimo, respeitá-lo.
E cada vez, num ciclo, na necessidade da sobrevivência, aprendendo a viver sem
esses pedacinhos...
2013 me trouxe o medo, o medo de gritar e provocar “os
poderosos” e sentir na pele o seu poder. Trouxe para a concretude podre e fria
da realidade aquilo que escrevíamos com frases tão bonitas e impactantes. Não
digo que trouxe, literalmente, mas desenhou na nossa frente a possibilidade,
abriu diante de nós um pequeno buraco em que espiar o que viria ou virá daqui pra
frente. Me trouxe o medo da realidade em que vivem milhares de pessoas, todos
os dias, perseguidas, assassinadas, sofridas... Me trouxe de repente aquela
inquietação e o susto, a falta do fôlego necessário para se jogar dentro desse
tufão monstruoso de mudanças – necessárias, não nego – mas profundas, tão
profundas... Trouxe a dimensão das ações, que tem suas reações e cuspiu na
nossa cara toda a nossa existência medíocre, contraditória e triste. Trouxe os
instrumentos, trouxe as indagações, as questões, as dúvidas, as incertezas. Experimentei não ter a mão e a voz experiente de
um amigo quando me desesperei. Experimentei uma realidade que conhecia, que
sabia que existia – mas só em livros. Experimentei a contradição.
2013 me trouxe a
necessidade de enfrentar meus próprios monstros interiores – mais uma vez, me
fazendo falar como quem extrai o veneno da cobra quando acabou de ser picado.
Me fez revisitar meu passado e entender que as opressões são mais destruidoras
e dilaceradoras do que imaginamos. Me mostrou que mesmo nós, que buscamos e lutamos
pelo feminismo dia após dia estamos longe, longe, longe da compreensão dos
danos que nos causa, a todos nós, o machismo. Me pesa hoje, mais do que nunca,
a opressão de milhões e milhões de mulheres que sofrem com isso todos os dias,
que convivem com isso, que respiram fundo e aceitam caladas, porque é tão mais
fácil... Que relevam, que desconsideram, que dão chances, chances e chances até
não terem mais chances.
Realmente, 2013 não foi um ano normal na vida de ninguém.
Por muito tempo me vi afetada, de alguma maneira, pela estranha profecia dos
maias de que o mundo acabaria em 2012. Desde 2008, quando um professor de física
do colégio contou sobre a tal profecia, um pedacinho de mim algumas vezes
matutava sobre isso, tentando buscar algum conforto na ciência. Não sou
religiosa, talvez por nunca ter encontrado aquilo que libertasse de verdade meu
espírito, talvez por não ser mesmo. Não nego as religiões, pelo menos não nego
a existência do universo, de energias, da alma. Não me privo de criticar a
religião na nossa sociedade moderna também, porque sei o quão mal ela pode
fazer. O que eu tenho certeza, hoje, olhando para todo o caminho que EU
percorri em 2013 – e que o mundo, todos os seus indivíduos percorreram – é que
2013 não foi e não será jamais um ano “normal” ou “mais um”. Nos mudou lá
dentro, alguns mais e outros menos, mas nos mudou de uma maneira que tornou
inevitável vivermos como vivíamos antes.
Por fim, e acho que o mais doce, mágico e surpreendente
de 2013 foi que, nesse ano, ao lidar com todos os meus dilemas e com as
tristezas e com os medos, aprendi a amar de uma maneira que nunca havia
experimentado antes. 2013 me trouxe o amor, me trouxe uma possibilidade, dentro
do caos, de respirar felicidade. Aos que me criticarem por ser clichê ou
piegas, admito: o clichê do amor burguês é mesmo uma droga, mas não existe
conforto e felicidade maior do que conhecer um indivíduo que te preencha, que
te inunde e que te faça transbordar felicidade. Eu arrisco dizer que 2013 me
trouxe um amor revolucionário, ao seu modo: me arrebentou o peito, o coração e
inflou minha alma, me ensinou infinitamente mais do que eu poderia me ver
aprendendo em tão pouco tempo. Em 2013 ganhei um companheiro, um companheiro
com quem dividir angustias, planos, medos, felicidades. 2013 me inundou de
possibilidades que jamais me imaginei cogitando, me trouxe a perspectiva de um
futuro, me preencheu daquilo que andava vazio.
Lido com esse ano na corda bamba das ambiguidades, no
fato de, em alguns momentos, nosso destino ser inexorável: a incerteza do trabalho,
do ganha-pão, da geração “nem, nem”, da convulsão que inunda o mundo, das catástrofes
naturais, da morte, da vida. 2013 foi o ano que, definitivamente, marcou a
minha vida. Não sei se arriscaria uma balança, porque no horizonte vislumbro a
resposta: não seriamos quem somos se não passássemos por todas as tempestades
da vida. Não seriamos quem somos se não pudéssemos amar, dividir, conviver. Não
seriamos humanos se não tivéssemos medos, angústias, incertezas. A verdade é
que todo mundo tem medo de morrer. Talvez não medo do mistério inexplicável que
é a morte, mas medo de tudo aquilo que fica pra trás, de tudo aquilo que não
vai mais poder ser vivido. Medo de tudo aquilo que foi construído e cultivado
por anos e que não vai mais ser sentido. A segunda verdade é que se não nos
damos conta, passamos a maior parte da nossa vida com medo, nos alimentando da
tristeza e da angustia de uma existência tão efêmera e contraditória. Eu pretendo ficar com o que 2013 me trouxe de melhor, nessa mistura de vida e morte, medo e
felicidade.