Quando eu descobri que não se tratava de amor. E muito menos de respeito.
Não é preciso conversar com muitas minas (heteros) para flagrar que os homens tem, num geral, o "modus operandi" bastante parecido. Claro, do topo da raiva e do desgosto que eu estou sentindo, eu conseguiria falar que isso, além de tudo, é bastante patético, porque comprova que nem a criatividade é algo presente no cérebro dos machos. Mas, a verdade é que a receita costuma funcionar, e convenhamos que quando uma receita funciona não faz sentido nenhum trocá-la.
É, bom. Algumas mulheres como eu - e eu me incluo nesse bolo sem um pingo de orgulho, mas preciso me reconhecer nesse bolo como primeiro passo para tentar mudar - algumas mulheres são ingênuas. Nós, mulheres ingênuas, somos ridiculamente programadas e ensinadas a acreditar no que um cara tem a nos dizer. Nós acreditamos na possibilidade de amar alguém apesar de qualquer coisa - e acreditamos que esse amor pode ser construído com respeito, admiração, companheirismo e sinceridade. E ai nós esquecemos que as coisas não são necessariamente assim. Que há uma receita, um protocolo a ser seguido. Que, de toda forma, no final das contas nós seremos as idiotas
que se comprometem demais ou que são ingênuas demais, que se envolvem demais. Como se isso fosse algum tipo de defeito imperdoável.
Mas, bom. A receita. A receita é simples: eles falam muito. Eles se abrem até o seu mais íntimo sentimento, demonstrando que eles tem medo porque já se machucaram muito no passado. Eles justificam o seu "ir com calma" com aquela velha história: já sofri muito por amor, quero ir devagar para não me machucar. Eles falam sobre sentimentos - e, claro, sobre os sentimentos deles por nós: como somos lindas, como somos diferentes, como eles gostam muito de nós e isso da medo. Alguns até fazem algumas "declaraçõeszinhas", alguns gestos que podem ser interpretados como o gesto mais romântico desde que Romeu morreu por amor à Julieta. Eles fazem mistério. Eles fazem chantagens emocionais sem que elas se pareçam chantagens emocionais. Eles escorrem nas nossas mãos jogando para nós a função de dar respostas às grandes perguntas: "isso é uma relação?" "nós estamos namorando?". Eles elogiam o sexo. Elogiam bastante o sexo. Eles manipulam e mesmo que no fundo a gente saiba que está tendo algum tipo de manipulação, nós permitimos, pois na noite passada eles disseram que estavam apaixonados e até publicizaram uma foto de vocês dois juntos.
Pois vejam só. Esses dias eu estava conversando com um amigo e contando para ele a experiência amorosa que eu estava tendo. Sinceramente, eu estava apaixonada. Bastante entregue, eu diria. Bastante afim de fazer o rolê funcionar, ter um companheiro, alguém para dividir as paradas da vida e essas coisas. É, e o grande X da questão era que parecia que ele estava totalmente envolvido - totalmente dentro. Yes, a gente pensa. É tão difícil gostar de alguém num geral, e tão difícil que isso seja recíproco...
As coisas mudaram de cor quando eu pude perceber que, nessa "relação" eu era uma espécie de depositário de sentimentos - alguém que recebia toda a carga emocional, e isso inclui todos os medos e aflições e todas as culpas de nóias e etc. Eu era um depositário de sentimentos da mesma forma que um vaso sanitário está no banheiro esperando por nós, pelo momento em que temos de satisfazer nossas necessidades. Ninguém procura um vaso sanitário para simplesmente ficar sentado nele. Pois bem. Eu tive a percepção de que eu era o vaso sanitário da "relação" e olha, não estou falando no sentido escatológico do tipo "me procuravam quando queriam fazer merda" - embora no sentido figurativo no fim das contas era EU quem me sentia como merda. Uma grande merda sem nenhum orgulho próprio.
Eu poderia ficar entrando em detalhes de cada ação, de cada dia de pequenos gestos ou frases que me faziam sentir assim - esse depositário, esse ser "acionado" a partir de uma necessidade egoísta, mesquinha de caras tipo esse. Eu poderia contar cada uma das vezes que eu, finalmente depois de reunir coragem, fiz algum tipo de cobrança sutil e polida, pedindo um posicionamento ali, uma palavra REALMENTE sincera - e não esse mantra estúpido que a maioria das pessoas gosta de repetir para os outros: "eu sou sincero. Eu sou a pessoa mais sincera que você vai conhecer na sua vida", como se repetir essa frase em cada encontro fosse realmente tornar a pessoa sincera, não sei se sem perceber que a sinceridade as vezes está nos gestos mais sutis e nas palavras não ditas ou ainda que, as pessoas mentem o tempo inteiro e essa é uma daquelas verdades realmente "xexelenta" porque não existe absolutamente NADA que a gente possa fazer sobre isso... Ou talvez até haja, como não ficar repetindo esse mantra estúpido tentando vender o que a gente não é. Ou quem sabe, mais ainda, não ficar dizendo coisas que NÃO SÃO VERDADE simplesmente por dizer... Porque eu entendo a mentira, já que as vezes eu também minto, mas tem aquela diferença entre mentir quando precisa ou quando é necessário e sem prejudicar alguém, mentir só quando pesar muito essa decisão e mentir o tempo todo como se fosse algo normal... Porque não tem sentido, sabe? não tem motivo.
Mas eu prefiro resumir da seguinte forma: esse tipo de pessoa, esse tipo de homem num geral nos procura quando eles querem ou precisam. Eles vem até nós pra resolver algum tipo de problema que eles tem, seja de auto estima ou alguma bad que aconteceu, porque é isso que eles fazem, eles depositam problemas em nós. E não foi diferente do que aconteceu. Eles tem a agenda cheia, entende? Eles tem muitos amigos e uma vida social muito agitada, para a qual você não é convidad. E ai eles te chamam de gata para compensar ou então mandam um coração no whatsapp porque eles sabem que você está absolutamente envolvida e comprometida com aquilo.
Eles dizem de um jeito meigo e fofo que eles querem MUITO te ver e se não poderia ser amanhã. Você concorda. Ai amanhã você diz o que quer fazer e descobre que ele fez algum plano que não envolve você - aliás, que envolve passar na sua casa 21:00 da noite para "ficar juntinho" - mas que não envolve você em nenhuma dimensão do mundo divertido e lotado de programas dele, ou não envolve você e suas vontades e seus horários.
Eles transformam a gente na merda da raposa cativada do Pequeno Príncipe, contando minutos para estar na presença dele, sentindo frio na barriga por poder vê-los, sendo feliz desde às 15:00 da tarde, sabendo que ele vem às 16:00.
Pois é. Você vai perder compromissos por causa dele (porque você precisa meio que ficar disponível, já que a disponibilidade dele é limitada, apesar dele jurar de pé junto que você é prioridade. Uhum). Você vai pensar que é melhor terminar tudo mesmo, antes que você esteja MAIS envolvida e seja uma bosta (porque já vai ser uma bosta mesmo, de todo jeito) e ai ele fala que está apaixonado por você e minutos depois "deixa escapar" que estar apaixonado é necessariamente, para ele, o primeiro passo para amar alguém E, PASME! Que gostar de você é fácil (no sentido de que faz bem, no sentido de que ele não pensa em mais ninguém e não quer ficar com mais ninguém) e ai por um dia você desiste de colocar um ponto nisso. Mas o dia seguinte está lá para nos lembrar de quão idiotas nós, mulheres ingênuas, somos. E ai ele da uma outra mancada, e você espera... Você espera porque no fim das contas você tem que decidir que essa REALMENTE será a última vez que isso vai acontecer. Porque você pode ser ingênua, mas você não é um depositário de sentimentos, uma privada que alguém procura para se livrar das necessidades e fazer você sentir como uma grande bosta humana de sentimentos.
E quer saber? Você REALMENTE não é isso. Tem essa série que eu assisto e que eu gosto muito e que eu passei 10 temporadas odiando e amando o casal principal, mas sempre com aquela pulga atrás da orelha com relação ao cara, porque ele era ÓTIMO, uma espécie de príncipe saído de um conto de fadas (juro!) e que dizia as coisas mais lindas do mundo e até demonstrava, mas ao mesmo tempo era simplesmente o cara mais idiota e egoísta e narcisista e eu ficava pensando "mas que raios ela tá fazendo com ele?" e ai um dia a amiga dela falou aquela frase linda, que não poderia ser mais encaixável do que nesse momento:
"Don't let what he wants eclipse what you need. He's very dreamy, but he is no the sun. YOU ARE".
Então, está ai. Porque você pode até ser ingênua, mas eu tenho certeza que isso só te faz mais extraordinária. E você não precisa de alguém que te faça mal. Você não precisa gostar de alguém que te faz sentir isso, que substituiu as borboletas no seu estômago por um dragão imenso de queimação e tristeza e angústia, um vazio incrível. Você, e eu, não precisamos de alguém que nos enche de expectativa sem o menor cuidado, sem sinceridade, sem amor, entende? Porque, eu sei, ninguém é obrigado a te amar, mas aquele amor ao próximo, aquele respeito... Isso eles precisam ter. E a gente precisa, desesperamente, arrancar isso deles. De todo cara que insiste em aparecer na nossa vida e, ao invés de somar, subtrai um pedaço de nós, nos faz nos anularmos - o maior crime que poderiamos cometer contra nós mesmas, nós mesmas nos anularmos por alguém que não faz a menor diferença - e que não te considera como alguém que se deve respeitar..
Nós não precisamos de alguém que não nos ama. Que não quer nos amar. Nós não precisamos mendigar atenção ou nos humilhar - porque isso não tem nada a ver com gostar de alguém. Essa humilhação, essa angústia - isso não tem nada a ver com gostar de alguém, então nós não precisamos disso.
Nós nunca precisamos disso, porque nós somos MUITO melhores do que isso. Muito.
Porque nós somos o sol - e foda-se, entendem? E foda-se a dor que nós vamos sentir em relação a isso, porque é essa merda dessa dor agora que vai nos resgatar de nos sentirmos um monte de bosta, depositário de sentimentos.
Eles não são o sol. Eles NUNCA são o sol, e especialmente eles não o são quando eles não querem ser.